França

“Mas museu só tem coisa velha, pô”

Museu do Louvre

Museu do Louvre

Por Felipe Franco

       O título do texto é uma homenagem a um amigo e sua inesquecível frase dita com a intenção de ridicularizar minha vontade de visitar um dos museus mais importantes do mundo. Entendo perfeitamente o comentário, afinal quem precisa de coisa velha em tempos que o novo dura uma semana e não deixa saudades. Seria interessante reservar um tempo para tentar identificar nas coisas velhas elementos que justifiquem nossa maneira de pensar e agir no dia a dia.

        Quer um exemplo?  A principal representação do inferno que passa de geração para geração foi escrita por volta do séc. XIII pelo italiano Dante Aliguieri em sua obra literária a Divina Comédia, dividida em: inferno, purgatório e paraíso. Depois disso, o poema ganhou forma por meio da pintura de artistas como Botticelli. Caso você seja praticante de alguma religião e já tenha ouvido um sermão sobre o inferno, certamente parte da Divina Comédia tenha sido usada pelo interlocutor, mesmo ele não sabendo disso. Ou seja, muito do imaginário coletivo, do comportamento, da maneira geral de ver o mundo, é construído com influência de “coisas velhas”. Portanto, ao entrar em um museu você tem a chance de descobrir “coisas novas” sobre você mesmo.

       Bom, após este exemplo dantesco, vamos à idéia central. Paris seguidamente é eleita como principal destino turístico do mundo e, sendo assim, a preocupação em tratar bem os visitantes deve fazer parte da cartilha local. Ouvi de alguns brasileiros que os franceses não gostam de comunicar-se em inglês e até aí tudo certo, falem em hebraico se assim desejarem. O importante é não nos privarem de obter informações sobre os pontos de visitação. Caso a prefeitura coloque um macaco inflável no Sena, é interessante haver uma descrição em “inglês” de o porquê daquilo estar ali. É o mínimo.

A badalada ponte dos cadeados sobre o rio Sena

A badalada ponte dos cadeados sobre o rio Sena

       Coloquei meus pés na cidade com o objetivo de visitar o Museu do Louvre, guardião de um patrimônio histórico incalculável. A Monalisa, de Da Vinci, está lá e por motivos óbvios fica no território do empurra-empurra, numa batalha para ver quem tira mais fotos. Gastei uns 5 minutos no salão, onde 4 foram observando pessoas já que tinha desistido de apreciar o sorriso enigmático de perto. A maioria que lá estava deve ter desenvolvido algum tipo de doença causada por uso demasiado de tecnologia. Aproximavam-se da obra já fazendo pose para o popular selfie, pronto para eternizar a ocasião numa fotografia, enquanto outros praticamente corriam pelos corredores filmando as paredes. Do jeito que está, a expressão “curtir o momento” cairá em desuso para dar lugar ao “eu estive lá”.

Tipo assim...

Tipo assim…

       Depois deste choque comportamental, desencanei e segui me aventurando pelo museu.  O salão do Egito foi meu primeiro destino, claro. Vi papiro, esculturas, jóias em ouro, hieróglifos em pedaços de pedra, ferramentas, instrumentos musicais, utensílios domésticos, sarcófagos… etc. Sensacional! A frustração começou a se aflorar aos poucos aos perceber que as obras não disponibilizavam descrição em inglês. Na parte do Egito há milhares de objetos de diferentes períodos, com particularidades relevantes, e os caras não se preocupam em disponibilizar a descrição em inglês? No principal destino turístico do mundo?

      Estou falando apenas de uma plaquinha com tradução do que já está escrito em francês, não vai doer nada e nem tomar muito tempo. Alguns dirão que é em função dos guias de áudio alugados em museus com diferentes idiomas para facilitar a vida do turista. Mas pelo que vi no Louvre, nem 20% das obras tem descrição em áudio, enquanto a maioria possui a tal plaquinha em francês. Fiquei sem entender.

Esta escultura, Escriba sentado, tem mais de 4.500 anos

Esta escultura do escriba sentado tem mais de 4.500 anos

      Quanto ao museu, o salão das artes foi o que mais me impressionou. Acostumado a ver as pinturas em livros, não imaginava que as telas fossem tão grandes e imponentes. A famosa obra do francês Delacroix, “A Liberdade Guiando o Povo” é belíssima e com grande simbologia histórica. Outra, “A coroação de Napoleão”, do também francês Jacques-Louis David, é de uma riqueza em detalhes impressionante e requer um bom tempo de observação.

Salão das Artes com a "Coroação de Napoleão" à esquerda (tela maior)

Salão das Artes com a “Coroação de Napoleão” à esquerda (tela maior)

      São inúmeras telas de artistas de diferentes países e períodos da história da arte. O prédio em si também guarda um alto padrão arquitetônico e artístico que pode ser visto principalmente no teto das galerias. Sem dúvida, valeu ter passado por Paris. O museu é enorme e impossível de ser visitado num só dia. Portanto, se você for até lá, a dica é pesquisar com antecedência as obras disponíveis e ir direto ao ponto. Além de estudar francês, é claro!

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